Países buscam crescimento, mas 2021 pode não ser animador
Especialistas analisam os efeitos de 2020 no próximo ano nos campos da economia, política e sociedade
Manaus - 'O ano que não terminou' seria um termo adequado para definir 2020, a considerar que seus efeitos serão sentidos ainda por muito tempo. Pandemia, crise econômica e desastres ambientais irão refletir em 2021, o ano que ainda nem começou, mas já é repleto de expectativas. Confira o que se espera do início da nova década ao redor do mundo.
O ano que se encerra deixa como saldo mais de 1,7 milhões de mortos pela Covid-19 ao redor do mundo no que já é considerado o principal evento do século. Por causa disso, a economia do mundo sofreu forte queda, com o Produto Interno Bruto (PIB) mundial atingindo -4,9%, o pior número desde a Segunda Guerra Mundial.
Alto desemprego, avanço da concentração de renda e consequente desigualdade social se mostram como as tintas que pretendem manchar os próximos anos, a começar desde agora.
Um novo ano difícil
Para o sociólogo Almir Oliveira, 2021 será um ano difícil de enfrentar e os acontecimentos recentes devem ditar mudança em todas as áreas, em especial na economia, saúde e educação.
"Estamos em plena pandemia, no meio do seu avanço com um total de mortos na média de quase mil óbitos por dia, no País. Os índices são alarmantes, e esse final de ano por si só já é diferente, o que sinaliza um 2021 de extrema dificuldade", afirma o estudioso.

Oliveira ressalta o aumento da desigualdade gerada pela pandemia, principalmente no que diz respeito ao desemprego e a dificuldade para acessar serviços básicos, como saúde e educação.
"Nossa economia está estagnada, patinando em índices de crescimento que não representam absolutamente nada. O desemprego está em alta. Além disso, a educação brasileira sofrerá com uma cicatriz em todos os níveis de educação com a perda de um ano letivo. Isso só fortalecerá o que chamamos de 'ultra-concentração' de renda", analisa o sociólogo.
O Brasil encerrou o ano com 14,1 milhões de desempregados, um aumento de 14,6%. O dado foi considerado 'positivo', já que a expectativa para o período era de 14,8%, como apontavam analistas, tais como a revista de finanças Valor Econômico. Ainda assim, a taxa de desemprego é a maior em oito anos.
Lenta recuperação econômica
Segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Produto Interno Bruto (PIB) mundial caiu - 4,9%, em 2020, número similar ao alcançado durante a Segunda Guerra Mundial. Já o Brasil viu a soma da sua produção econômica de 2020 cair -6,5%, o pior resultado em 120 anos. A expectativa é que esses números melhorem gradualmente no ano seguinte.
Para Francisco Mourão Junior, presidente do Conselho Regional de Economia (Corecon-AM), haverá recuperação econômica no Brasil e no mundo, mas a passos lentos. Segundo ele, ainda há muitos obstáculos que permitam essa previsão uma realidade.

"Nesta semana vimos a segunda onda da Covid-19 ganhar força. Somado a isso, o auxílio emergencial está sem previsão para ser estendido no ano que vem. Além do mais, a inflação já está em alta e a previsão é que continue a crescer", afirma o economista.
Ao destrinchar os tópicos citados, o especialista explica que dois fatores serão decisivos para definir como será o ano de 2021 na economia. A variação do dólar e a conjuntura dos países.
"O dólar está muito alto e isso afeta os países, dentre eles, o Brasil. O agricultor brasileiro precisa decidir entre exportar ou vender pro mercado interno. E com a moeda americana valorizada, ele exporta. A atitude faz faltar produto no país, o que eleva os preços e consequentemente causa mais inflação", ressalta Mourão.
Por conta disso, ele diz que a previsão para o mundo é um recrudescimento de medidas mais 'protecionistas', que é quando os países priorizam seus mercados para salvar a economia. Além dos Estados Unidos, o economista cita a dependência econômica com a China.
"A produção da China, por exemplo, é muito competitiva. Então provavelmente haverá esse protecionismo, e um exemplo é que o Japão já começou a retirar parte suas empresas do território do dragão asiático. Isso deve ser uma tendência mundial", comenta o presidente do Corecon-AM.
Volta do multilateralismo
Nesse cenário internacional, além do protecionismo, o que deve ser fortalecido é o chamado 'multilateralismo', segundo especialistas. O termo é utilizado para definir a relação entre países através de blocos ou grupos de interesse comum, a exemplo, os blocos econômicos.
Recentes ações haviam levado o mundo para o lado contrário a isso, ou seja, o 'bilateralismo'. Dois casos memoráveis foram a saída dos Estados Unidos do acordo de Paris, a favor do clima, e o 'Brexit', quando o Reino Unido deixou a União Europeia.
O advogado Helso Ribeiro, presidente da Comissão de Relações Internacionais da OAB-AM, é um dos que acredita na volta do multilateralismo.

"Durante o governo Trump, os processos integrativos, a união de países, abrandando a soberania de cada um, não foram estimulados. No entanto, o novo presidente Joe Biden aponta para um diferencial, e os processos integrativos com certeza serão retomados e a conjuntura de blocos irá aumentar a partir do ano que vem", argumenta o especialista.
Apesar de tantas incertezas, Ribeiro cita Lulu Santos em 'Tempos Modernos' para ressaltar sua expectativa positiva para com o futuro. "Tudo passa, tudo passará", e complementa frase com uma citação de Heráclito, um filósofo grego do período pré-socrático.
"Um homem não pode entrar duas vezes no mesmo rio. Ou seja, embora haja um '2020 parte dois' a caminho, com certeza haverão outros acontecimentos que farão com que o futuro não seja linear", afirma o analista.
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